COMO A EDUCAÇÃO DAS FORÇAS DO CARÁTER PODE SER DETERMINANTE PARA O DESENVOLVIMENTO DO ALUNO

Assim, o bem-estar deveria “ser ensinado na escola por três motivos:
como um antídoto à depressão,
como um meio para aumentar a satisfação com a vida,
e como um auxílio a Psicologia Escolar e Educacional,
uma melhor aprendizagem e a um pensamento mais criativo”.
(Seligman & cols., 2009, p. 295)

Nesse sentido, faz-se necessária uma revisão das metas educacionais, que devem passar a priorizar, além do aprendizado acadêmico tradicional,
a educação social, emocional e ética, promovendo o bem-estar,
as virtudes, e preparando os jovens para se tornarem indivíduos realizados e cidadãos responsáveis.
(Cohen, 2006)

A palavra educação tem origem no termo latino EDUCARE, palavra composta do prefixo EX – que significa FORA, mais a raiz DUCERE – que significa guiar ou conduzir.

Esta é a essência de qualquer projeto educacional; capacitar o educando para a conquista da autonomia.

Do nascimento à vida adulta, dentre todas as espécies, o ser humano é de longe o que nasce mais dependente, e o que precisa de mais tempo para atingir a maturidade. Embora pareça, a princípio, um paradoxo que a espécie mais capaz cognitivamente seja a que apresenta maior “imaturidade neurológica” ao nascer; na verdade, é esta imaturidade que possibilita a incrível capacidade de desenvolvimento de habilidades e competências.

O altíssimo grau de imaturidade dos diversos domínios neurológicos, comparado com as futuras capacidades da vida adulta, traduzidos pela necessidade total de amparo por parte dos pais ou cuidadores fica evidenciado na total dependência de cuidados para que a criança possa sobreviver e se desenvolver.

Os bebês, antes de falar, precisam aprender a ouvir uma vez que, ao nascimento, os sons captados pelo ouvido e transformados em impulso elétrico precisarão encontrar uma rede de neurônios capaz de decodificá-los e interpretá-los. Este processo de altíssima complexidade envolve um período de intensa reorganização das redes neuronais quando muitas conexões são criadas e fortalecidas enquanto outras são eliminadas. Este processo de desenvolvimento da audição acontece graças ao potencial do código genético, mais os estímulos que promovem as modificações deste aparato biológico para se adaptar às demandas do meio em que este está inserido. Portanto, o desenvolvimento das diferentes funções neurológicas, sejam elas relacionadas a visão, audição, linguagem ou motora, só para citar algumas, é o resultado de uma reorganização dos padrões de conexões neuronais, incluindo o processo de mielinização, responsável pelo aumento da velocidade e eficácia da transmissão do impulso nervoso que é a resultante do estímulo do meio e o quanto este estímulo desencadeia a expressão genética.

Para entender melhor o que é a Expressão Genética, basta constatar como mudamos de cor, graças ao aumento da produção de melanina, quando passamos um período de maior exposição ao sol. Este processo reflete como os Gens que estão em nossa pele comportam-se de diferentes formas em diferentes situações. Em períodos de pouca exposição ao sol, nossa pele fica muito mais clara, não há necessidade de produzir muita proteção contra os raios solares, portanto os Gens responsáveis pela melanina se expressam em menor intensidade, e o mesmo ocorre de forma inversa quando existe uma necessidade de proteção contra o sol, em um período de maior exposição.

O nosso código genético não é uma carta que sela nosso destino, pelo contrário, ele representa um número quase infinito de possibilidades que se realizarão ou não de acordo com nossa experiência. Nossos Gens, dependendo dos estímulos aos quais são submetidos, se expressam de formas múltiplas e variadas. Isso significa que, desde a cor da pele até o desenvolvimento de redes neuronais capazes de compreender Física Quântica, passando por ser mais magro, gordo ou musculoso, tudo é uma questão de como nossos Gens mudam nossas Vidas e como Nossas Vidas mudam nossos Gens.

Entender a natureza de como os seres vivos são altamente influenciados e constantemente adaptados às necessidades impostas pelo meio e pela experiência, é condição para se libertar de paradigmas e mitos construídos, muitas vezes, pela divulgação de falsas crenças pelo senso comum.

O conceito de Inteligência é, sem dúvida, uma grande vítima desta divulgação e transmissão de falsos conceitos. É comum, por exemplo, uma mãe rotular o próprio filho como muito inteligente ou por não ser muito inteligente, mas em compensação ser esforçado.

Do ponto de vista da neurociência, não tem sentido questionar se alguém é ou não é inteligente, mas sim se está ou não está inteligente. A questão aqui é muito simples e está amplamente demonstrada pela comunidade científica. A inteligência é a capacidade de processar informações e dar respostas nos mais diferentes domínios neurológicos.

Imagine uma pessoa que tem dificuldade para expressar suas ideias, mas demonstra alta capacidade em interpretar textos. Qual seria a medida de Inteligência desta pessoa? Mais que isso, se esta mesma pessoa se submeter a um teste específico de linguagem e tiver um resultado X, e passar dois meses se dedicando para melhorar sua capacidade linguística, o resultado deste mesmo teste, se for aplicado novamente, apresentará um resultado X + Y. Então, quanto esta pessoa é inteligente? O primeiro resultado ou o segundo? Na verdade, nenhum dos dois, pois o quanto esta pessoa é inteligente é a pergunta errada. Melhor seria perguntar o quanto esta pessoa está inteligente para desempenhar especificamente uma habilidade ou competência. Pergunte a um pianista profissional o que acontece com sua capacidade de performar uma peça musical se o mesmo ficar um período sem praticar com seus teclados? As capacidades podem ser elevadas ou diminuídas e até perdidas, pois tudo é uma questão de quanto se estimula determinada rede neuronal e quanto esta rede se adapta respondendo com mais eficiência. Desta forma, a inteligência, a excelência e até a genialidade são fruto da interação de nossas experiências e o quanto estas desencadeiam a expressão genética.

Em outras palavras, somos o fruto da interação entre nosso organismo, com sua respectiva carga genética e os estímulos gerados pela nossa experiência, em uma equação que a modificação de cada variável, modifica o resultado final.

Nada é estático em um organismo vivo, tudo está em constante modificação. Entender esse processo dinâmico nos habilita a agir de forma consciente sobre e alterar o resultado desta equação.

Tanto as diversas competências dos diversos domínios neurológicos, incluindo as questões relacionadas com a forma como se processa a emoção, as Virtudes e forças do Caráter até as nossas características físicas, como quantidade de gordura ou de massa muscular são estabelecidas pela interação que estabelecemos com o meio, e, em maior ou menor escala, podem ser modificáveis.

A Inteligência e o Caráter podem ser desenvolvidos e o desenvolvimento dos mesmos modifica a forma como são processadas as respostas que são dadas nos desafios cotidianos o que, por sua vez, modifica os hábitos e, em última instância, o destino.

Os mecanismos biológicos para se modificarem as capacidades – inteligência e caráter – vêm de presente com o nascimento; aprender a usar estes mecanismos deve ser a conquista de cada um.

A parte mais fundamental no processo de aprendizagem na Educação do Caráter é a Metacognição.

Metacognição é o movimento de pensar sobre o próprio pensamento. Refletir sobre a forma que se processa a informação ou de como se reage em situações diversas é um mecanismo de autoconhecimento essencial para que as forças do Caráter possam ser desenvolvidas.

Na Educação do Caráter, os alunos serão levados a conhecer o trabalho dos cientistas Dr. Seligman e Dr. Peterson que desenvolveram o Manual das Virtudes e Forças do Caráter. Neste trabalho de grande importância, que alicerçou a base científica sobre a qual está firmado um novo e importante movimento na área da psicologia, a Psicologia Positiva, os cientistas descrevem as 24 forças do caráter, organizadas em 6 virtudes básicas.

As forças de caráter estão descritas e organizadas com rigor científico e forma definida obedecendo critérios históricos e transculturais. Isto é, existe uma base filogenética, aparato biológico construído e diferenciado pela própria evolução da espécie humana, e uma base cultural que, além da identificação das forças do caráter nos documentos que remontam a história da humanidade nos últimos 3000 anos, também foi observada a necessidade de tais forças do caráter fazerem parte de todas as culturas contemporâneas.

O processo de conhecimento das diferentes forças do caráter obedecerá uma dinâmica de contextualização que colocará cada força de caráter de forma suficientemente significativa para que esta provoque uma auto-avaliação e a necessária reflexão, fundamental ao processo metacognitivo.

A Educação do Caráter é uma iniciativa que extrapola a função intrínseca da escola, como instituição responsável pelos meios necessários à aprendizagem, para outro nível que pretende instrumentalizar o aluno a fim de aumentar sua capacidade de se apropriar efetivamente do que está sendo oferecido. Dessa , os alunos não estão limitados pelo que é oferecido pela escola, mas pela capacidade de transformar o que está sendo oferecido em efetiva formação.

Sabemos que há muito mais capacidade para ser desenvolvida e a Educação do Caráter tem como meta ajudar cada aluno a superar seus próprios limites e ser uma pessoa cada vez melhor para si mesmo e para o mundo.

Ricardo Gaspar